Historiadora da UNICENTRO explica porque é necessária uma campanha pelo fim da violência de gênero em Guarapuava. Entidades iniciam a campanha "16 Dias de ativismo pelo fim da Violência Contra a Mulher"
21 de Novembro de 2013 às 12:20:36Por que uma campanha pelo fim da violência de gênero?
Em 13 de dezembro de 2012, neste mesmo jornal foi publicado um texto meu sobre a quase inexistência de homens apoiando publicamente (e com ênfase) o debate sobre a Violência contra a Mulher, que tem acontecido no cenário político em Guarapuava. As vésperas da campanha internacional "16 Dias de ativismo pelo fim da Violência Contra a Mulher", é preciso pensar com a urgência sobre o lugar dos homens nesse debate.
Obviamente que essa luta se concretizou historicamente, e se concretiza todos os dias, com o protagonismo das mulheres. Não poderia ser diferente.
No mundo ocidental, o direito das mulheres serem consideradas "gente" é construção dos movimentos de mulheres e dos movimentos feministas. Inúmeras mulheres levaram adiante o sonho de terem direitos civis: votar, estudar nas universidades, direito à propriedade, herança, direito a guarda dos filhos, etc.
A luta pela autonomia das mulheres e pelo respeito aos direitos humanos são, ainda, base da pauta. Pauta construída com muitos cartazes, muitas campanhas, muitas marchas, prisões, manifestações e, infelizmente, muitas mortes de mulheres. Elas foram e são as donas dos megafones, das vozes, dos gritos e de seus corpos. Pintados ou não, nus ou vestidos.
O direito a uma vida sem violência e os direitos reprodutivos ainda são os grandes celeumas. Em terras de feminicídio, o debate sobre os direitos reprodutivos das mulheres se restringem ao mundo universitário. A violência explícita contra as mulheres consegue arrebanhar simpatizantes para esse debate: o sangue que jorra com a faca ou o revólver comove muito mais do que o sangue da hemorragia clandestina.
Mesmo assim, o sangue das mulheres, derramado em terras de Guairacá, e a classificação do município entre os 100 mais violentos do país para as mulheres, não conta com a presença enfática de homens.
A conquista do Movimento das Mulheres, e de outras entidades, para a criação da Secretaria Municipal de Políticas Públicas para as Mulheres, foi um grande passo nesse sentido. Os projetos desenvolvidos por uma secretaria quem ainda não tem um orçamento próprio tem enfocado principalmente a autonomia das mulheres das classes populares. Os resultados, nesse caso, aparecem a médio e longo prazo, obviamente se tiverem continuidade.
Porque é necessário o combate acirrado ao Feminicídio e a Violência Contra a Mulher? Qualquer pessoa que acompanhe os noticiários locais e esteja minimamente despida de seu machismo apoia essa iniciativa. Somente no mês de outubro cinco mulheres foram assassinadas. Nosso outubro, de rosa, virou vermelho. Nos registros policiais, em média são 3 casos de violência doméstica por dia.
Além dos índices assustadores que colocam o Paraná como um dos novos polos da violência, os requintes de crueldade no modus operandi, nos apontam uma masculinidade doente. Degola, braços e dentes quebrados, mãos e dedos decepados, tiro no rosto, além das sevícias sexuais. As estatísticas e a maneira como essas mulheres tem sido mortas não nos dizem sobre elas. Nos dizem sobre os homens. Nos dizem sobre a construção da masculinidade.
As respostas dos sujeitos sociais pautadas pela violência, principalmente a violência extrema do feminicídio, se encontram em uma relação direta com uma masculinidade periclitante, em crise.
Além da violência em si sofrida, seja violência física, violência sexual, assédio sexual no trabalho, feminicídio, as mulheres sofrem ainda a violência da sociedade que de maneira muito cruel as culpabiliza pela violência recebida.
Nas redes sociais, principalmente em alguns sites que se advogam fazer jornalismo, o ódio as mulheres, o machismo e o sexismo escorrem entre as palavras. Ou na escrita do/a dito/a jornalista ou dos bondosos/as leitores/as. Para essa boa sociedade, não basta uma mulher ser estuprada ou ter a mão decepada. Não basta que ela seja morta. Para essa boa sociedade, que dá sustentação a violência de gênero, é preciso dar o seu parecer sobre as vítimas: "era puta, tilanga ou vadia"; "gostava de apanhar", ou cometeu o crime de "estar na rua". É preciso matar as mulheres muitas vezes. Até as que continuam vivas. Essa boa sociedade apoia, todos os dias, os homens que cometem violência contras as mulheres.
Sim, essa nossa sociedade precisa com urgência de políticas públicas e campanhas no combate a aberração cultural da misoginia. Nós precisamos falar dos homens, da construção dessa masculinidade, e com os homens. Guarapuava precisa enfrentar sua imagem no espelho.
Profa. Dra. Rosemeri Moreira
Departamento de História da UNICENTRO
Fonte: Jornal Diário de Guarapuava