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Até 2016, nova lei deve triplicar vagas para cotistas nas universidades federais. Na estadual UNICAMP a administração afirma que o ganho na diversidade no campus compensa. Na UERJ estudo mostrou que a taxa de evasão dos cotista

23 de Dezembro de 2012 às 19:07:02



FÁBIO TAKAHASHI
DE SÃO PAULO


Uma grande mudança no perfil de calouros nas universidades públicas está em curso no país: em quatro anos, o número de cotistas nas federais deverá quase triplicar.

A alteração é imposta por lei federal --cuja implementação está em andamento-- que exige que as universidades mantidas pela União reservem até 2016 ao menos 50% das suas vagas para formados em escolas públicas.

Hoje, a partir de ações individuais, as cotas para esse público abrangem 19% dos postos, segundo levantamento feito pela Folha com as 62 universidades e faculdades federais do país -30 delas não têm nenhuma cota.

Em números absolutos, das 224 mil vagas, 42 mil estão reservadas para os estudantes da escola pública.

A vantagem para esses estudantes é que eles disputam postos somente entre si.

Sem as cotas, essas vagas tendem a ser ocupadas por estudantes de escolas privadas, que em geral recebem ensino de melhor qualidade.

A regra federal define também grupos específicos de alunos da rede pública que serão beneficiados. Os com baixa renda devem ocupar metade das vagas reservadas.

Ainda dentro da cota para escolas públicas, deverá haver postos reservados para pretos, pardos e indígenas.

A distribuição das vagas para esses alunos dependerá da proporção das populações no Estado sede da instituição, segundo o Censo do IBGE.

Ou seja, haverá uma combinação de cotas sociais, relativas à renda, com cotas raciais, relacionadas à autodeclaração da cor da pele. O denominador comum entre os cotistas é que todos deverão ter cumprido todo o ensino médio na escola pública.

A regra ficou 13 anos em discussão no Congresso e foi sancionada pela presidente Dilma em agosto. Já em 2013, as instituições deverão reservar 12,5% das vagas para estudantes da escola pública.

USP, Unesp e Unicamp estudam a adoção de proposta na mesma direção, a pedido do governador paulista Geraldo Alckmin (PSDB).

PRESENTE

O impacto da política federal, com base em experiências já existentes, é difícil de ser projetado. Algumas escolas dizem não ter dados, caso da Unifesp, a primeira em São Paulo a adotar a política.

Os estudos disponíveis avaliam ações que, em geral, têm formato diferente do previsto na lei. Nesses trabalhos, uma conclusão comum é que os cotistas entram com desempenho pior, mas depois compensam a diferença.

A hipótese dos analistas é que os beneficiados valorizam a vaga e se empenham.

Ainda é desconhecido, porém, o efeito da cota de 50%.

Na Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), que reserva 45% de suas vagas, a taxa de evasão dos cotistas é menor que a dos demais.

Estudo na UnB (Universidade de Brasília) feito pelos pesquisadores Maria Eduarda Tannuri-Pianto (UnB) e Andrew Francis (Emory University-EUA) aponta que o aumento de negros na instituição não aumentou a diferença de rendimento que já existia em relação aos brancos.

A UnB reserva 20% das vagas para estudantes negros.

Além disso, a população beneficiada passou a disputar cursos mais concorridos.

Na Unicamp, onde há bônus no vestibular para alunos de escolas públicas e um adicional segundo a cor da pele, o abandono entre não bonificados e bonificados da rede pública é igual (24%).

A taxa, porém, é um pouco maior entre pretos, pardos e indígenas (28%). A universidade decidiu manter a ação, e diz que o ganho na diversidade do campus compensa.

Entre os professores, a constatação é que o cotista tem um desempenho inferior no primeiro ano, mas depois deslancha e praticamente se iguala ao não cotista. Estatísticas mostram que homens cotistas e não cotistas apresentam uma média final de 5,9 nas notas. Entre as mulheres, as não cotistas obtêm 7,1 e as cotistas, 6,9.

O tempo de permanência até a conclusão do curso é o mesmo. Mas a taxa de evasão dos cotistas é inferior: 20%, em comparação com 33% dos não cotistas.

"O cotista é mais esforçado, pois ele sabe que essa pode ser a única chance de mudar sua vida", afirma Hilda Ribeiro de Souza, professora de odontologia. "O que mudou é que agora o professor precisa dar mais atenção, não só supervisionar."

Na sala de aula, não é possível saber quem é cotista. A cor da pele pode ser uma pista. A maioria concorda que existe um racismo velado e que a segregação entre os alunos não é incomum.

O cotista com culpa não é um ponto fora da curva. Especialmente em disciplinas que exigem cálculo, nas quais as deficiências de formação são mais visíveis. Segundo um cotista de economia, que preferiu não se identificar, "muitos sentem vergonha no início. E há preconceito".

Por outro lado, o aprendizado resultante do convívio com a diferença é valorizado: "É bom juntar todos na mesma sala. Eu mal saía da zona sul, nunca tinha conhecido ninguém que pegava trem para ir ao colégio", diz a aluna de direito Raissa Oliveira.

O reitor da Uerj, Ricardo Vieralves, afirma que o nível de qualidade do ensino na universidade não caiu depois da adoção das cotas.

A comparação da performance dos formandos da universidade no Enade antes e depois da adoção da medida mostra que a média geral na Uerj se manteve, com pequenas mudanças nas notas, para cima ou para baixo, dependendo da faculdade.

Colaboraram EDUARDO VASCONCELOS e VALMAR HUPSEL FILHO