Adusp questiona Reitoria sobre denúncia de que estaria em tratativas com grupos empresariais sobre novo modelo de gestão para a USP
21 de Setembro de 2016 às 11:42:22Em 14/9/2016, a Adusp recebeu denúncia anônima de que a Reitoria da USP estaria em tratativas com um grupo de grandes empresários, que teriam contratado a empresa internacional de consultoria McKinsey&Company por intermédio de um “Termo de Doação de Serviços” cuja finalidade seria “criar um novo modelo de captação de recursos e gestão de orçamento para a universidade”.
Segundo a denúncia, haveria “Termo de Doação do trabalho dessa consultoria, no qual a Mckinsey consta como anuente” e a Mckinsey já teria apresentado um plano de 20 semanas de trabalho com objetivo de planejar “o futuro da universidade” e “criar um novo modelo de captação de recursos e de gestão do orçamento”, o que “indica uma possível mudança de legislação, bem como uma possível cobrança de mensalidade em cursos oferecidos pela USP”.
Quem faz a denúncia considera que, “pela magnitude, complexidade e grau de desenvolvimento do projeto em questão” trata-se “de tema de interesse não apenas de toda a comunidade USP, mas de todo cidadão, cabendo à Reitoria agir com transparência e com o devido respaldo de seus órgãos colegiados”. Pede que a Adusp “cobre da Reitoria providências para que isso assim aconteça”.
Audiência no Palácio
Diante da constatação de que, no dia 5/9/2016, a agenda oficial do Governador do Estado de São Paulo registrou a realização de audiência no Palácio dos Bandeirantes com as presenças dos professores Marco Antonio Zago, reitor da USP, Vahan Agopyan, vice-reitor da USP, e Américo Ceiki Sakamoto, coordenador do Projeto “USP do Futuro”; de representantes da própria empresa Mckinsey, como Patricia Ellen, Marcus Frank, Roberto Fantoni; de Nicola Calicchio Neto, presidente da Comunitas; e de dirigentes empresariais como o presidente do Conselho da Natura, o presidente do Grupo Cosan, o diretor de relações institucionais e comunicação corporativa do Itaú e um conselheiro da Ultrapar Participações S/A, o que permite considerar verossímil o teor da denúncia, a Diretoria da Adusp cuidou de protocolar em 19/9/2016 ofício ao reitor no qual solicita em termos legais “esclarecimentos sobre o objeto e os termos da relação formal estabelecida com a empresa McKinsey e os grupos empresariais citados, as informações relacionadas ao Projeto ‘USP do Futuro’, o propósito da audiência realizada no Palácio dos Bandeirantes, assim como os passos porventura planejados para divulgação e debate destas iniciativas e projeto com a sociedade, em especial com as instâncias administrativas e colegiadas desta Universidade” (confira aqui o protocolo).
Controle centralizado via “Nova CPA” para garantir a ingerência de grupos empresariais na USP?
Os elementos da denúncia e da audiência havida no palácio do governo, na compreensão da Diretoria da Adusp, suscitam e devem suscitar preocupação diante das possíveis relações que, se de fato confirmadas, parecem guardar relação com as tantas e desastrosas iniciativas que a gestão M.A. Zago-V. Agopyan tem adotado e proposto para a USP, sempre baseadas nas premissas de que a USP poderia prescindir do aumento do aporte dos recursos repassados pelo Estado para a sua manutenção; de que seria preciso adequar ou redimensionar a universidade aos recursos financeiros disponíveis; e de que a prioridade para mudanças estatutárias e normativas se encontraria na implantação de procedimentos de “avaliação” por meio da “Nova CPA”.
Considerando a insistência da Reitoria em fazer aprovar seu projeto centralizado e controlador da atividade docente e dos projetos acadêmicos de departamentos e unidades, mesmo diante da ampla rejeição das instâncias institucionais, é possível que nos elementos dessa denúncia possam ser encontradas parte das razões até agora não reveladas para explicar o processo em curso.
Não é de agora que se tem denunciado as diferentes formas por meio das quais a privatização da USP vem sendo ampliada: atuação de fundações privadas ditas “de apoio”, cursos pagos, convênios com cláusulas de sigilo. No entanto, é notável o modo cada vez mais confortável com o qual são consideradas, defendidas e propaladas propostas de que seria possível e adequado financiar a USP por meio de outras fontes de recursos, que não as do Estado, por meio de parcerias com o setor privado e de cobrança de mensalidades.
Será que diante da consistente oposição que parte significativa do corpo da universidade e da sociedade faz a esse tipo de perspectiva e de iniciativa, a Reitoria teria enveredado pela via de, no plano externo, iniciar tratativas sigilosas com representantes de interesses privados e comerciais para que venham a desfrutar de ingerência na gestão e no controle das fontes de recursos que sustentem a USP, enquanto no plano interno, em nome da alegada “excelência”, “valorização da docência”, “prestação de contas para a sociedade” são tomadas providências para implementar mecanismos de controle e avaliação que sirvam de sinalização para que os grupos empresariais em questão tenham segurança de que aquilo que eventualmente negociem com USP e/ou com o governo estadual, em relação ao que a universidade deve ou não deve fazer, estará garantido, uma vez que a Reitoria terá o devido controle sobre as atividades e os projetos de seus docentes e unidades?
E tudo isso, em flagrante afronta à perspectiva da educação como direito, à obrigação do Estado de oferecer gratuitamente o direito à educação em todos os níveis e à autonomia de gestão administrativa e financeira que as universidades públicas devem gozar?
Diante do exposto, consideramos urgente e necessário que a Reitoria venha a público se explicar. Se confirmada a denúncia, é fundamental que seja esclarecida a origem dessa iniciativa; quais setores da estrutura administrativa da USP participaram e/ou tiveram conhecimento do projeto; e as razões pelas quais as informações a respeito teriam sido omitidas do conhecimento público e das instâncias colegiadas da universidade.
Apenas quando desvelados com transparência todos os aspectos dessa questão, como deve ser na esfera pública, é que se poderá saber da verdadeira dimensão do fato, e se a denúncia ou as preocupações dela decorrentes fazem ou não sentido. Isso é urgente e necessário!