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Decreto 4.189/2016 do Governo Beto Richa é aplicável às Universidades?

07 de Junho de 2016 às 15:53:02

O governo do Paraná publicou em 27 de maio de 2016, o Decreto 4.189 que intenciona definir competências e procedimentos para a realização de despesas da Administração Direta e Indireta do Poder Executivo do Estado do Paraná e dá outras providências.


A questão é: ELE É APLICÁVEL ÀS UNIVERSIDADES?


Em informação preliminar à categoria, o Sindicato dos Docentes da UNICENTRO - ADUNICENTRO - divulga o acórdão relativo ao Mandato de Segurança 20.599-8 impetrado pela UEM e UEL, quando da tentativa do Governo Jaime Lerner em atentar contra a autonomia universitária pretendendo forçar sua adesão ao SIP (Sistema Integrado de Pagamento). A não adesão das Universidades implicaria coercitivamente em não liberação de pagamento de pessoal.


O referido decreto 4.189/16 busca, por parte do Governo Beto Richa, impor idêntico controle sobre a UNICENTRO em que pese ataque à autonomia universitária, já garantida pela Constituição Federal.


Em 1992 a UEM e UEL ENTRARAM COM MANDADO DE SEGURANÇA. NÃO É O CASO DA REITORIA DA UNICENTRO TOMAR A MESMA ATITUDE? 


Segue abaixo a decisão favorável à garantia de autonomia de gestão obtida pela UEM e UEL (Publicado na Revista Autonomia Universitária, p. 77)


O acórdão


 


TRIBUNAL DE JUSTIÇA


IMPETRANTES: UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA E UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ.


IMPETRADOS: 1) SECRETÁRIO DE ESTADO DA ADMINISTRAÇÃO;


 SECRETÁRIO DE ESTADO DA FAZENDA;


 SECRETÁRIO DE ESTADO DO PLANEJAMENTO.


 RELATOR: DESEMBARGADOR SYDNEY ZAPPA, VENCIDO.


RELATOR PARA O ACÓRDÃO: DESEMBARGADOR WILSON REBACK.


MANDADO DE SEGURANÇA. UNIVERSIDADE. AUTONOMIA. ART. 207, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ART. 180, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARANÁ. LEI ESTADUAL Nº 9.663/91. INGERÊNCIA EXTERNA DE OUTRAS


 ENTIDADES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SEGURANÇA CONCEDIDA.


 Preceituando o art. 207 da Constituição Federal, reproduzido no art. 180, da Constituição Estadual, a autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial nas Universidades, não pode a Administração pública inibir ou interferir naquela autogestão administrativa ditando normas que embaracem ou impeçam, tais como análise prévia de custos e a implantação no sistema integrado de pagamento do Estado para liberação de pagamento de pessoal.


 Ao Estado não se nega a fiscalização, pelos mecanismos adequados, das dotações orçamentárias, mas sem ingerência da autonomia administrativa e financeira das Universidades Estaduais, constitucionalmente assegurada.


 Vistos, relatos e discutidos estes autos nº 20.599-8, de mandado de segurança, de Curitiba, sendo impetrantes a Universidade Estadual de Londrina e a Universidade Estadual de Maringá e impetrados os senhores Secretário de Estado da Administração, Secretário de Estado da Fazenda e Secretário do Estado do Planejamento.


 I- Trata-se de mandado de segurança impetrado pelas Universidades Estaduais de Londrina e de Maringá, com pedido liminar, contra atos praticados pelos Senhores Secretários de Estado da Administração, da Fazenda e do Planejamento, bem exposto no ilustrado Parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça, a seguir transcrito:


 “1. As Universidades Estaduais de Londrina e Maringá, através do presente “writ”, pleiteiam a concessão da segurança, com pedido de liminar, em caráter preventivo e repressivo, contra atos praticados pelos Exmos. Srs. Secretários Estaduais das Pastas de Administração, Fazenda e Planejamento, que estariam ferindo o direito líquido e certo dos impetrantes, consubstanciado no art. 207, da Constituição Federal, art. 180, da Constituição Estadual e art. 4º, da Lei Estadual nº 9.663, de 16.06.91, que as transformou em autarquias especiais.


 Dizem as impetrantes que “referido ato de conteúdo impregnado de ameaça a direito subjetivo (líquido e certo), das impetrantes é veiculado através de telex (doc. 01), e traz a toda evidência “periculum in mora”, eis que encontra-se vazando nas seguintes determinações: “Encaminho a Vossa Senhoria, para conhecimento e providência cabíveis telex recebido, nesta data, das Secretarias de Administração, Fazenda e Planejamento cujo teor abaixo retransmitimos: “ Solicitamos comunicar às Instituições de Ensino Superior, exceto FunFAFI, que não haverá a liberação de pagamento de pessoal a partir do mês de fevereiro, sem que haja implantação no SIP e a análise prévia do custo. Tal determinação é conseqüência das orientações já emanadas a partir de setembro de 1991” (fls. 1/2- TJ).


 Prosseguem dizendo que o ato acima mencionado, assim como outros que relaciona às fls. 7/9 TJ (Decretos, Resoluções, Avisos e Ofícios) “inibem a autogestão administrativa, pertinente às impetrantes, transferindo o comando ao Governo Central. Tal constrição cria sérios embaraços à dinâmica diuturna das IES, gerando toda sorte de dificuldades, inclusive no setor docente” (fls. 9 TJ)..


 Na seqüência, alegam que “dia 26 de fevereiro, do corrente, as impetrantes, através de seus Reitores, dirigiram-se à Secretaria de Estado da Indústria e Comércio, Ensino Superior e Ciência e Tecnologia e foram informados que o pagamento estava sustado pela ausência de cadastramento tendente à implantação no SIP. Todavia, após exaustivas negociações ficou deliberado que se as impetrantes iniciassem o cadastramento seria o numerário transferido. Tais negociações produziram intenso desgaste físico e mental pelas implicações decorrentes. Superada a iminência deste autêntico atentado à autonomia das IES a constrição persiste, razão pela qual pleiteia-se, nesta exordial, a concessão do “writ” em duplo efeito, vale dizer: preventivo e repressivo, pelas razões até aqui explicitadas” (fls. 13 TJ).


 E, finalmente, requerem a concessão de segurança, “no sentido de que cesse a prática de tais atos e seja garantido o normal funcionamento das impetrantes, direito líquido e certo das mesmas, face as leis e as disposições constantes das Constituições Federal e Estadual” (fls. 14 TJ).


 As autoridades impetradas prestam as informações de fls. 128/140 TJ, argüindo duas preliminares. Na primeira, apontam a inépcia da inicial, por falta de pedido (art. 295, parágrafo único, I, do CPC). Na segunda, alegam ilegitimidade passiva, argumentando que “os atos administrativos do governo do Estado” elencados no item 3 , letras “a” a “x” são leis, decretos, resoluções e circulares. O telex referido logo no intróito da inicial está assinado pelo Diretor Geral da Secretaria de Indústria e Comércio, Ensino Superior, Ciência e Tecnologia SETI, sendo questionável a indicação dos Secretários que assinam esta informação como autoridades competentes- legítimas a figurar como sujeitos passivos da impetração.


 No mérito, sustentam a ausência de ato abusivo causador de lesão ou ameaça de lesão a direito líquido e certo das impetrantes, que, como Autarquias, devem submeter-se ao rol de exigências, formalidades, controles e normas relativas à administração Pública, “exvi”, do art. 37, da Constituição Federal.


 A liminar foi indeferida, através do r. despacho de fls. 147 TJ.”


 Ouvida, a douta Procuradoria Geral de Justiça, em Parecer da lavra do eminente Procurador Francisco Borba Forbes de Sá, opinou pelo desacolhimento das preliminares e pela denegação da segurança, pelo mérito.


 II- No que concerne às preliminares, realmente não ensejam acolhimento, merecendo destaque o já aludido parecer do Ministério Público:


“Inicialmente, quanto à argüição de inépia da inicial, a mesma não procede.


 Na verdade, segundo se colhe em J.J. Calmon de Passos, a “falta de pedido”, referida no art. 295, parágrafo único, inciso I, do CPC, deve ser entendida não só como ausência total do pedido, como também a “formulação ininteligível ou insuscetível de cognição do pedido” (comentários ao código de Processo Civil, 3º edição, vol III, pág. 288).


 No caso em apreço, lendo-se a inicial, vê-se que a mesma contém pedido e este é plenamente inteligível. É evidente que os impetrantes estão pleiteando a concessão de segurança para que as autoridades impetradas abstenham-se de praticar atos como aquele referido no telex de fls. 17 TJ, que, segundo as requerentes, estariam ferindo a autonomia das Universidades Estaduais.


 Sendo o pedido inteligível não há que se falar em inépcia da inicial. Não procede, também a alegação de ilegitimidade passiva.


 Com efeito, as autoridades impetradas não negam em suas informações, terem expedido a determinação contida no telex de fls. 17 TJ.


Por outro lado, é claro que o Diretor Geral da Secretaria de Estado da Indústria e Comércio não pode ser apontada como coatora neste “mandamus”, por isso que se limitou, única e exclusivamente, a comunicar às impetrantes a ordem emanada das secretarias de Administração, Fazenda e Planejamento.


 Caso os impetrados tivessem se utilizado do Diário Oficial para fazer a comunicação contida no telex de fls. 17, não poderia, certamente, o Diretor da Imprensa Oficial ser apontado como autoridade coatora.”


 III- Quanto ao mérito, porém, em que pese espeito que merecem as aqui mui dignas autoridades impetradas culto Procurador de Justiça que oficiou na causa, a concesda segurança impõem-se, pois os atos impugnados efetivamente ringem as disposições constitucionais que asseguram a autônomas Universidades, independentemente de sua caracterização a fundação ou autarquia.


 Preceitua o art. 207 da Constituição Federal “as universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”.


 A Constituição do Estado, em seu artigo 180, dispõem de modo idêntico, acrescentando, no parágrafo único deste artigo que “as instituições de ensino superior atenderão, através de suas atividades de pesquisa e extensão, a finalidades sociais e tornarão públicos seus resultados”. Já o art. 181, da mesma Carta, preceitua: “As instituições de ensino superior do Estado terão recursos necessários à manutenção de pessoal, na lei orçamentária do exercício, em montante não inferior, em termos de valor real, ao do exercício anterior.”


 A lei Estadual nº 9.663/91, que promoveu a transformação das impetrantes em autarquias, - até então fundações, - reproduziu, no art. 4º, exatamente a disposição do art. 180 da Constituição Estadual, reafirmando a autonomia das Universidades.


 Tais preceitos constitucionais e legais não poderiam ter sido adotados pelos legisladores com alcance idêntico às normas atinentes à administração pública em geral. O intuito do Constituinte foi, exatamente, assegurar às universidades a autonomia necessária para que sejam atingidos os princípios também constitucionais, alusivos à educação. Retirou as universidades dos azares e percalços atinente à administração pública, reservando-lhes papel que extrapola as normas do serviço público resguardando-as da submissão a concepções de um momento político determinado e passageiro.


 A autonomia constitucionalmente assegurada às universidades, impede o controle pretendido através dos atos impugnados-implantados no Sistema Integrado de Pagamento (SIP) e análise prévia de custo, que, consequentemente, infringem as disposições em questão.


 As Universidades Estaduais do Paraná são autarquias, mas autarquias de natureza especial, porque a norma constitucional lhes assegura a autonomia, não só didático-científica, mas também de gestão financeira e patrimonial. Autonomia de gestão financeira e patrimonial significa que a própria entidade vai gerir seus recursos, aplicando-os de acordo com as próprias prioridades e administrando seu patrimônio sem ingerências outras. Autonomia quer dizer faculdade de governar a si mesmo ou autogoverno. É certo que os recursos necessários, fornecidos pelo Estado do Paraná, devem atender as normas orçamentárias, mas o Estado dispõe de mecanismos adequados de fiscalização, que não incluem a possibilidade de gestão financeira. A verba orçamentária, outrossim, não pode constituir-se em instrumento de pressão.


 O ato impugnado, reproduzido no documento de fls. 17, implica em lesão a direito líquido e certo das impetrantes, com induvidosa ameaça consistente na assertiva de que, sem que houvesse “implantação no SIP e a análise prévia de custo” não haveria liberação de pagamento.


 As Constituições Federal e Estadual asseguram autonomia às universidades, fundada em valores maiores que elas devem proporcionar. Salienta José Afonso da Silva, com base em comentários elaborados pelo Prof. Anísio Teixeira, que a norma constitucional não poderia ser diferente:


 “Se se consagrou a liberdade de apreender, de ensinar, de pesquisar e de divulgar o pensamento, a arte e o saber, como um princípio basilar do ensino (art. 206, II), a coerência exigia uma manifestação normativa expressa em favor da autonomia das Universidades, autonomia que não é apenas a independência da instituição universitária, mas a do próprio saber humano, pois as universidades não serão o que devem ser se não cultivarem a consciência da independência do saber e se não souberem que a supremacia do saber, graças a essa independência, é levar a um novo saber. E para isto precisam viver a atmosfera de autonomia e estímulos vigorosos de experimentação, ensaio e renovação. Não é por simples acidente que as universidades se constituem em comunidades de mestre e discípulos, casando a experiência de uns como o ardor e a mocidade de outros. Elas não são, com efeito, apenas instituições de ensino e pesquisa, mas sociedades devotadas ao livre, desinteressado e deliberado cultivo da inteligência e do espírito e fundadas na esperança do progresso humano pelo progresso da razão.” (Curso de Direito Constitucional Positivo- ed. R. T., 1990, págs. 703/704).


 Finalmente, não é demais ressaltar que a norma do art. 207 da Constituição Federal, dando plena autonomia às Universidades, não encontra paralelo nas Constituições anteriores, de 1946 e 1967/1969, tratando-se de evidente inovação, não tendo sido inserida na Carta de 1988 por simples acidente, mas deliberadamente, como acima ficou salientado. Norma nova que, oxalá seja bem interpretada e utilizada pelos poderes públicos, e por elas, Universidades.


 Diante do exposto:


 Acordam os Juízes Integrantes do 2º Grupo de Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por maioria de votos, em conceder a segurança para o fim de garantir as impetrantes o direito de livre e normal funcionamento, sem a ingerência dos impetrados consubstanciada nos atos impugnados.


 Custas, como lei.


 Curitiba, 28 de maio de 1992.


 RONALD ACCIOLY- Presidente, sem voto


 SYDNEY ZAPPA- relator, vencido


 WILSON REBACK - relator do acórdão com voto vencedor


 OSWALDO ESPÍNDOLA- vencido


 Participaram do julgamento, acompanhando o voto do Desembargador Wilson Reback os eminentes Desenbargadores CARLOS RAITANI e TROIANO NETTO e a eminente Juíza Convocada Doutora DENISE ARRUDA.


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