Balanço da gestão de Zanette (2003-2011) frente à reitoria da UNICENTRO - Parte I
13 de Setembro de 2011 Ã s 20:58:27O Professor Zanette conclui agora em 2011 seu mandato de reitor da UNICENTRO. Tendo estado frente à reitoria por oito anos consecutivos foi eleito em 2003 e reeleito em 2007. Em 2003 houve chapa concorrente, em 2007 Zanette concorreu sozinho.
Como toda administração, esta deixa seus legados. Do ponto de vista da democracia interna da UNICENTRO, o legado não foi bom.
Zanette deixa marcas na sua passagem pela reitoria da Universidade. Algumas de grande importância para a Universidade tais como a abertura de cursos de mestrado e doutorado e ampliação dos espaços físicos da UNICENTRO. Quem esteve na UNICENTRO até 2003 e a observa hoje vê uma nítida mudança de sua face, principalmente nos campi do CEDETEG e Irati. Zanette também imprimiu sua marca na forma de administrar a Universidade. Herdou muita coisa da estrutura que recebeu de seu antecessor, o Prof. Carlos Gomes, que também esteve frente à reitoria por oito anos consecutivos. Tal como Carlos Gomes, Zanette também formulou mudanças no Estatuto e Regimento da UNICENTRO. Findando sua passagem pela reitoria da UNICENTRO é justo que se faça uma análise deste período. Bem como as consequências para o princípio da gestão democrática que a UNICENTRO deveria observar a partir da implantação do novo Estatuto que está há seis anos em vigor.
Zanette iniciou sua administração na reitoria em um momento em que a UNICENTRO tinha pouco mais de 350 professores efetivos e cerca de 215 funcionários técnico-administrativos (hoje denominados agentes universitários).
Zanette, quando iniciou sua administração a estrutura administrativa dispunha de 217 cargos, entre funções gratificadas (FGs) e cargos em comissão (CCs) segundo o Estatuto da UNICENTRO que vigorou até 2006. Em 2006 o Conselho Universitário (COU) aprova um novo estatuto que levantou significativa polêmica à época. Para uma UNICENTRO, em 2005, com 410 professores efetivos e pouco mais de 200 funcionários o novo estatuto criou 586 cargos entre FGs e CCs. A razão era de quase um cargo por pessoa! 627 pessoas para 586 cargos. Agora, em 2011, são 490 professores efetivos e 240 funcionários. Isto significa que há disponibilidade de cargos para 82% dos membros efetivos da instituição. Dos 586 cargos criados apenas 102 são eletivos. Os demais (484!) são preenchidos mediante designação da reitoria.
Proporcionalmente, nenhuma outra caneta de administrador público deve acumular tanto poder quanto a de qualquer Reitor da UNICENTRO. O Conselho Universitário (COU), a instância colegiada mais importante da UNICENTRO, que aprovou o novo Estatuto tinha, em sua composição no ano de 2006, 35% de seus membros com cargos de confiança do Reitor. Nesta mesma época o CEPE, tinha 30% de seus membros detentores de cargos de confiança do reitor e o CAD 60%.
Na UEM, por exemplo, os departamentos pedagógicos não encontram intermediários para se fazer representar no Conselho Universitário. Todos os departamentos tem um representante, eles próprios, neste Conselho. Cada departamento elege um representante entre seus pares e este não pode deter cargo de confiança da reitoria.
Princípios básicos da republica, que remontam a Montesquieu, insistem na independência entre os poderes. Isso é salutar para qualquer organização democrática. Não obstante, mesmo com a independência dos poderes o processo democrático sofre com a interferência do executivo no legislativo. Mas, na UNICENTRO, executivo, legislativo e judiciário constitui em um amálgama e ávido pela "unanimidade".
No sistema republicano, em vigor no Brasil, ninguém pode exercer cumulativamente cargos no executivo, legislativo e judiciário. Se um deputado é chamado a ser ministro, ele obrigatoriamente se licencia. Nenhum vereador pode ser secretário municipal e ao mesmo tempo vereador. Em algum momento o conflito de interesses vai ocorrer. O hipotético vereador-secretário, embora eleito pela comunidade, mas também indicado pelo prefeito ao votar em matéria contrária ao prefeito poderia ser destituído de suas funções como secretário. Ou, ao contrário. Para se manter no cargo de secretário poderia votar contra um interesse da população. Bendito e sábio o princípio republicano da independência dos poderes que previu isso.
No entanto, um COU (aquele de 2006), em que 35% de seus membros deviam seus cargos e correspondentes gratificações pelo exercício deles ao Reitor aprovaram um novo estatuto. Apesar de o Brasil ser uma República, a UNICENTRO se organiza de forma muito pouco republicana e isto tem consequências sobre a necessária observância à gestão democrática.
Tendo 484 cargos para distribuir, pois apenas 102 são eletivos (chefes de departamento, diretores de setor, diretor de campus e o próprio Reitor) Zanette conseguiu imprimir um modo de administrar incontestável. Incontestável no sentido de ser uma administração que reage mal à contestação. Desde 2006 praticamente não há mais disputa para os cargos eletivos na UNICENTRO. Na última eleição para chefias de departamento (38) não houve um em que duas chapas estiveram inscritas. Para diretores de setor, dos nove (9) que existem, apenas em um deles houve duas chapas na última eleição.
Tendo a UNICENTRO 586 cargos (sendo que destes, apenas 102 são eletivos) é de supor que a caneta do Reitor tenha uma razoável força para influir, se assim desejar, em qualquer processo eleitoral na universidade, inclusive nos conselhos superiores.
Após a aprovação do novo estatuto em 2005, com a criação de 371 novos cargos por um Conselho Universitário em que 35% detinham cargos de confiança, Zanette não teve opositores em sua eleição para mais um mandato. Nesta eleição em 2011, o rumo segue no mesmo sentido. A UNICENTRO vai se consolidando ideologicamente de forma monolítica. A situação chegou ao ponto de Zanette pleitear ser vice nesta nova administração. Chamados a decidir sobre a candidatura situacionista, os cargos comissionados demonstraram um mínimo de bom senso e impediram a manobra. Isso significaria 12 anos ininterruptos na reitoria ao menos, senão 16.
Tendo se livrado de seus oponentes desde 2003, o método optou pela imposição da vontade, e a criação do sistema burocrático seguiu-se rapidamente. O recurso à compulsão nomeativa criou um modelo que não mais depende da quantidade ou qualidade da produção, mas, em grande medida, de arranjos políticos. A burocracia conferiu, maquinalmente, prioridade aos meios políticos para exercer força sobre a comunidade universitária, colocando as alavancas acadêmicas em segundo lugar.
A maioria das pessoas, ainda hoje, vê a burocracia como formalidades, empurra-empurra de papéis e obstruções. No entanto, essa se faz revelar, subterraneamente consolidando fundamentos que faz substituir as forças democráticas pela força da organização todo-poderosa. A história tem mostrado que a burocracia termina por levar ao mando de uma só pessoa. No entanto, como produto final, a aparência que fica é a de uma administração coletiva.
Com tamanha força para nomear cargos comissionados, a UNICENTRO vem se tornando uma entidade universitária uniforme em seu modo de pensar. O consenso e unanimidade parece ser a ordem do dia.
Ainda ao final do governo Requião, este, impressionado com o que estava acontecendo nas universidades do Estado envia à Assembléia Legislativa, projeto de lei que visava regulamentar os cargos das IEES (Lei 16.372/2009). A então secretária da SETI, Lygia Pupatto já havia anunciado, em princípio de 2006, em reunião com os sindicatos que havia um acordo com os reitores para não se ampliar o número de cargos nas IEES. No momento da elaboração do novo estatuto a UNICENTRO, entretanto, não manteve o acordo. O argumento do governo, à época, era de que os gastos com a folha de pagamento das IEES era elevado pela grande quantidade de gratificações e que por isso, era difícil conceder reajuste salarial para toda a categoria. Daí a necessidade de regulamentar a quantidade de cargos. Os docentes amargaram grave defasagem salarial por quase 10 anos. Na proposta do governo Requião haveria redução de 270 cargos na UNICENTRO, passando de 586 para 316. A UNICENTRO chega a editar a resolução nº 16-GR/UNICENTRO, de 2010, adequando o número de cargos de acordo com a Lei. Mas, a resolução não chegou a ser implantada. Ao se licenciar para ser candidato ao Senado, Requião deixa o governo do estado e assume Pessuti. Logo na primeira semana de seu mandato Pessuti, que também tentava se firmar como candidato ao governo do Paraná, prorrogou até o final do ano o prazo para a UNICENTRO se adequar à lei que regulamentava os cargos. Não obtendo sucesso em se lançar candidato ao governo e no mês que deixou o governo propôs nova prorrogação da regulamentação para o final de 2011.
No processo eleitoral em vigência, dos cerca de 11 mil eleitores, 752 são docentes (entre efetivos e colaboradores) e 238 agentes universitários (técnicos-administrativos). As regras definidas no estatuto aprovado em 2005 faz com que o voto de um agente universitário valha 3,15 mais do que o de um professor na eleição para reitor. O voto de um agente universitário continua valendo mais que o voto do reitor e vice-reitor juntos! Em 2003, quando houve a última disputa para reitor da UNICENTRO o voto de um agente universitário valia 2,1 professores. Esse dado revela que o voto dos professores vem progressivamente diminuindo de importância na decisão eleitoral da UNICENTRO. Mas também mostra que, em oito (8) anos a atual administração foi pouco competente em fazer o governo entender como prioridade que nosso quadro de agentes universitários é muito reduzido. Resultando em sobrecarga não somente a estes últimos com trabalho administrativo, mas também os professores.
A distorção chega ao ponto inaceitável de que, no CEDETEG, para diretor de campus, o voto do mesmo agente universitário valha o mesmo que sete (07) professores! No CEDETEG são cerca de 280 professores e 40 agentes universitários. De forma não surpreendente, mais de 90% dos agentes universitários da UNICENTRO, como um todo, detém cargos de confiança da reitoria. Com o peso do voto maciço dos agentes universitários com cargos em comissão, o candidato situacionista pode entrar na â??disputaâ?? virtualmente com 30% do eleitorado já â??fechadoâ?? que lhe deve ser simpático.
Na última vez em que houve disputa eleitoral para Reitor da UNICENTRO (em 2003), a chapa situacionista obteve 98% dos votos dos agentes universitários. Mas, ao mesmo tempo em que os agentes universitários têm grande peso como eleitores lhes têm sido obstruída a possibilidade de figurarem como candidatos.
As peculiaridades do que se chama de democracia na UNICENTRO levanta outras questões para refletir. A comissão eleitoral que rege o processo (COEL). A mesma que age como â??juizâ?? da partida, conta com 17 membros, sendo dois estudantes. Mas desses 17 membros, seis (6) deles detém cargos de confiança da reitoria. Isso significa um terço da comissão eleitoral. Ainda que possamos querer confiar na honestidade das pessoas o que não pode é haver nada que possa transparecer falta de imparcialidade daqueles que atuam na regulação do processo. Melhor seria se na comissão eleitoral não houvessem membros com cargo em comissão. Estes podem ser fiscais de candidatos, mas não â??juízesâ??. Afinal de contas a comissão vai disciplinar a disputa e pode inclusive aplicar punições. Ainda que se possa argumentar que a escolha dos membros da COEL foi feita entre os seus pares não há como negar que o ato de nomeação da mesma foi feita pelo reitor-em-exercício/candidato. Candidato escolhido entre os pares comissionados. Nomear a COEL é da competência da reitoria, mas também lhe cabe zelar pela probidade de seus atos.
Objetivamente não se trata de â??criminalizarâ?? quem detém cargos em comissão. Essa representaria uma falsa discussão. Pretender enveredar por esse caminho é lançar uma cortina de fumaça com o objetivo de desviar-se do debate central deste texto. Não vamos nos furtar a debater as repercussões da mistura entre o executivo e legislativo dentro da universidade. É salutar levantar essa discussão, que do ponto de vista do processo republicano brasileiro que é matéria pacífica. A independência entre o executivo e legislativo. Quem detém cargo em comissão faz parte do poder executivo da UNICENTRO.
Na mesma linha de raciocínio e por analogia com as eleições gerais do Brasil, tanto na mesa que vai receber os votos como aquela que vai apurar os votos não seria sensato contar com membros da comunidade que detém cargos em comissão. Estes participaram da escolha de seus candidatos e, portanto têm interesse direto no resultado do pleito. A imprensa de Guarapuava noticiou amplamente a reunião em que Zanette chama os cargos comissionados para uma reunião na ACRE com o objetivo de definir os candidatos situacionistas. É notório que os cargos comissionados cumprem com zelo e empenho suas atribuições administrativas, mas o senso de probidade deveria ser o suficiente para se absterem de compor as mesas receptoras e apuradoras de votos.
Como pode haver várias candidaturas neste contexto? Com uma reitoria que dispõe de uma caneta que acumula poder de nomear mais de 480 pessoas com cargos de confiança em uma Universidade com 490 professores efetivos e 238 agentes universitários, qualquer outra candidatura é literalmente pulverizada antes mesmo de nascer. A falta de debate entre visões diferentes de universidade deixa o processo preocupantemente empobrecido.
O princípio da autonomia universitária, que nos é tão caro, se voltou contra a própria comunidade universitária e ao princípio da gestão democrática ao ser usado para a centralização do poder em torno de um pequeno grupo.