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Getúlio: a intimidade do presidente nos seus últimos 19 dias de vida

02 de Junho de 2014 às 00:22:22


O filme começa com uma leitura retrospectiva do diário de Getúlio Vargas, obra de suma importância para quem busca compreender a intimidade do presidente




Professor Dr. Hélvio Alexandre Mariano

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No filme, o ator Tony Ramos, em uma bela interpretação no papel do presidente Getúlio Vargas (Foto: Divulgação)



O filme "Getúlio", em cartaz desde o dia 1º de maio no Brasil, e agora exibido também em Guarapuava, é uma ótima alternativa para quem gosta de História. Mais ainda: de um capítulo da nossa história que ainda rende muita discussão sobre os reais motivos que levaram ao suicídio do então presidente da República no dia 24 de agosto de 1954.

No filme, o ator Tony Ramos, em uma bela interpretação no papel do presidente Getúlio Vargas, vive os últimos 19 dias de vida de Getúlio. A intimidade do presidente, seu cotidiano no Palácio do Catete e toda a crise política que abalava o país e, principalmente, o presidente, que estava sendo acusado de ter ordenado o atentado contra seu maior inimigo na época, o jornalista Carlos Lacerda, interpretado por Alexandre Borges. O espectador tem oportunidade de ver na tela a tensão daqueles dias, o ambiente que antecede uma decisão que marcaria para sempre a história do Brasil. Dos riscos de uma revolta armada com derramamento de sangue até a opção final pelo suicídio, sem antes deixar seu testamento político escrito em uma carta direcionada ao povo brasileiro.

O filme começa com uma leitura retrospectiva do diário de Getúlio Vargas, obra de suma importância para quem busca compreender a intimidade do presidente. Ali, Getúlio relata que, segundo ele, "só o sacrifício da vida pode resgatar o erro de um fracasso", passagem que havia escrito há mais de 24 anos em seu diário. O trecho teria sido escrito "um pouco antes de ele pegar um trem em Porto Alegre com destino ao Rio de Janeiro, onde conforme Getúlio, sua missão era ser presidente da República. De líder  de uma revolução que queria mudar o Brasil a ditador por um longo período, Getúlio escreve que não se arrependia de nada, muito menos de censurar os jornais, fechar o Congresso e cancelar as eleições presidenciais, pois acreditava sempre governar para o povo e se sentia amado por ele. O motivo deste amor, ainda hoje estudado por historiadores que se dedicam ao período, é descrito no filme por Getúlio, ao dizer que foram as leis de proteção ao trabalhador, o salário mínimo, as férias remuneradas que fizeram dele o grande estadista do Brasil.

A sequência é excepcional, com um Getúlio relembrando que foi deposto pelos militares sim, os mesmos que antes o haviam apoiado. E que viveu cinco longos anos de exílio e solidão, voltando ao cargo em eleições diretas, para ser novamente presidente do Brasil, onde derrotaria outra tentativa de golpe militar e aprovaria no Congresso, o mesmo que fechara anos antes, a nacionalização e o controle do petróleo, que passou para as mãos do Estado, criando a Petrobras.

Em tempo de CPIs da Petrobras e de compras de refinarias de petróleo fora do Brasil, é interessante analisarmos os episódios da nacionalização do petróleo e de todo este processo que foi a construção de projeto de desenvolvimento, que ia da extração ao refino do óleo em território nacional. Segundo o professor do Departamento de Geografia da Unicentro e doutor em História pela Universidade Federal Fluminense, Pierre Alves Costa, no seu livro "A cidade do Petróleo, uma geo-história do refino do petróleo no Brasil", publicado pela Editora Unicentro, "quando Vargas chega à presidência pela segunda vez, em 1951, a questão do petróleo tinha adquirido tal expressão na vida política e econômica do país, que dificilmente poderia ser desprezada". Segundo Pierre, as metas principais eram as relacionadas com as atividades de pesquisa, industrialização e armazenamento dos refinados. Abrindo um parêntese, diz o professor, ressaltamos que a mensagem presidencial ao Congresso na abertura da sessão legislativa de 1951 apontava que o Estado iria instruir e fomentar o processo de acumulação de capital no sentido da implantação das indústrias de base e da infraestrutura essencial para o crescimento econômico. Para o professor Pierre Costa, as eleições de 1950 recolocaram Getúlio Vargas no poder, mas desta vez, Vargas tinha um compromisso de aprofundar a industrialização nacional, sendo importante solucionar a questão do ouro negro.

Getúlio é um dos personagens centrais da história do Brasil, da luta pela nacionalização do petróleo até as chamadas leis sociais, passando pelo Estado Novo até o desfecho surpreendente que deu a sua vida, deixando um registro que pode ser também visto no filme, onde ele diz que ter lutado contra a espoliação do Brasil, contra a espoliação do povo. Que lutou de peito aberto e o ódio, as infâmias e a calúnia não abateram seu ânimo.

Getúlio termina sua vida deixando o recado que havia dado sua vida ao povo, e que no final lhe daria sua morte. Assim, termina sua vida dizendo que "nada receio, serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História".

O filme "Getúlio" está em cartaz na cidade. Uma boa opção para tempos de nacionalismos exacerbados pela Copa do Mundo e por fervorosos defensores de CPIs da Petrobras. O livro "A Cidade do Petróleo" pode ser adquirido na livraria que fica na Universidade Estadual do Centro-Oeste.

Professor doutor do Departamento de História da Unicentro em Guarapuava